sábado, novembro 6

Sobre arbitragem

Faz um tempão que não venho aqui. Não faz mal, pois ninguém sentiu faltam, reivindicou algo ou reclamou. Mas de qualquer forma, estava (ainda estou demasiado atarefado). Aulas, dissertações, bancas de monografia, supervisão de estágio, artigos... tudo cansa e, infelizmente, o retorno não é tão imediato quanto eu pensava.

Mas o que me levou a escrever este post foi algo que soube esta semana e até que postei no tuíter algo baseado nisto: Tribunal de Arbitragem aqui em São Luís.

Devo começar minha fala, dizendo que não sou contra os meios alternativos de solução de conflitos. Por alternativo, eu quero dizer duas coisas: 1) eu reconheço que somente há jurisdição pelo Estado, ou seja, somente o Estado, através de uma esfera específica, o Poder Judiciário, é o único responsável para solucionar conflitos existentes. Dessa forma, mas isso não significa (e aqui, entro na parte 2) que existe algumas possibilidades de solucionar esse conflito de uma forma que não seja a de buscar a tutela estatal. E note-se que estou utilizando o termo "alternativo".

Para que haja essa solução a par da estatal, são necessários alguns requisitos: a) deve haver autorização legal; b) ambas as partes devem confiar e querer que a solução não se dê sob a autoridade judiciária e c) não são todos os direitos que devem ser solucionados sem a intervenção estatal (os famosos direitos indisponíveis não podem ser objetos de solução sem a intervenção do Poder Judiciário).

E aqui reside minha crítica principal a esse Tribunal (não apenas a ele, mas qualquer um que aja da mesma forma). O primeiro requisito já foi preenchido: a lei n. 9.307 de 1997 regulamenta a arbitragem no Brasil, mas em momento algum disse que os árbitros assumem o papel de juízes e que, para exercerem sua função, necessitam de fazer algum curso ou ter carterinhas de juízes. Além disso, não disse que era necessária a existência de um TRIBUNAL para solucionar esses conflitos.

E hajam juízes com carteirinhas, hajam fotos de juízes titulares, juízes arbitrais, corpo de peritos e inauguração do Tribunal (com a presença - pasmem - do Defensor Público Geral do Estado). Esses membros pagaram um curso caríssimo para se tornarem "juízes" e a maioria são empresários. Dessa forma, até que ponto essas decisões arbitrais são válidas ou imparciais (não que as sentenças sejam imparciais, mas, pelo menos no âmbito estatal, a pessoa prejudicada pode recorrer judicialmente ou administrativamente a órgãos como o CNJ). No caso da arbitragem, não há essa possibilidade.

E ainda sobre isso, há algo que acho mais temerário e até mesmo totalitário: esse Tribunal se denomina, em seu regimento interno, de justiça prviada. Isso é bem diferente de meio alternativo de solução de conflitos. Justiça privada dá uma noção bem liberal de que o Estado não deveria interferir em interesses particulares.

Além disso, a maioria das pessoas provavelmente assinarão contratos (de adesão - em grande parte dos casos) nos quais haverá uma cláusula de compromisso arbitral, ou seja, de que qualquer conflito advindo do referido contrato (vamos pensar em um contrato de de compra e venda de algum bem ou de financiamento de algum imóvel) será resolvido por meio de arbitragem e que o local para solução do conflito será o referido tribunal arbitral. Assim, o requisito que eu falei acima na letra b vai por terra, porque quem assinou o contrato não está exprimindo a vontade de solucionar o conflito por arbitragem. Assinou com vistas a ter seu imóvel, seu financiamento etc.

E vai chegar o ponto em que um empregado vai se ver obrigado - no momento da assinatura do contrato de trabalho - a aderir à arbitragem. Assim, esse empregado vai ter muitos de seus direitos trabalhistas violados, mesmo sendo indisponíveis. Isso tudo por conta dessa Justiça Privada.

Creio que deveria haver uma maior fiscalização por parte do Ministério Público no tocante a esse aspecto.

2 comentários:

Waldy Ferreira disse...

Mestre,

engana-te quando afirmas que tuas sábias e bem ditas palavras não fazem falta aos humildes de conhecimento como eu. Saudades das aulas e das discussões acadêmicas. Quanto ao texto, acredito mesmo que o Estado é, como disse Hobbes, o Leviatã e, por conta disso, é o detentor do Poder-dever de dizer o direito, isto é, de exercer a jurisdição. Apesar de ser um defensor das formas e dos métodos alternativos de solução de conflitos, não vejo com bons olhos a arbitragem "julgando" demandas originariamente de competência do Poder Judiciário. Trocar-se um juiz por um árbitro pode não ser um bom negócio, mesmo sabendo que já existem muitos árbitros vestindo toga. FORTE ABRAÇO!!!

Waldy Ferreira disse...

Mestre,

engana-te quando afirmas que tuas sábias e bem ditas palavras não fazem falta aos humildes de conhecimento como eu. Saudades das aulas e das discussões acadêmicas. Quanto ao texto, acredito mesmo que o Estado é, como disse Hobbes, o Leviatã e, por conta disso, é o detentor do Poder-dever de dizer o direito, isto é, de exercer a jurisdição. Apesar de ser um defensor das formas e dos métodos alternativos de solução de conflitos, não vejo com bons olhos a arbitragem "julgando" demandas originariamente de competência do Poder Judiciário. Trocar-se um juiz por um árbitro pode não ser um bom negócio, mesmo sabendo que já existem muitos árbitros vestindo toga. FORTE ABRAÇO!!!